A Polícia Federal está investigando o caso do barco encontrado à deriva no Pará no último sábado (13) com diversos cadáveres em decomposição dentro da embarcação.
O barco, com 15 metros de comprimento por 2 de largura, foi encontrado no rio Caeté por pescadores em uma área conhecida como Barra do Quatipuru, próxima à praia de Ajuruteua, no município de Bragança (PA), localizado a cerca de 215 quilômetros de Belém, capital do estado.
Logo no sábado, pouco depois de a embarcação ter sido localizada pela população local, a Polícia Federal enviou técnicos ao Pará para iniciar os trabalhos de identificação dos corpos. Outros médicos foram deslocados para lá no domingo (14), dia em que o barco começou a ser resgatado.
Segundo a PF, os trabalhos são realizados em parceria com a Marinha e com órgãos estaduais de segurança do Pará, como Polícia Militar, Polícia Científica, Polícia Civil e Corpo de Bombeiros.
Ao todo, nove corpos foram encontrados, sendo que oito estavam dentro do barco. Outro corpo estava perto do veículo –segundo a PF, “em circunstâncias que sugeriam fazer parte do mesmo grupo de vítimas”.
A polícia encontrou alguns documentos junto aos corpos, que revelaram que as vítimas eram do continente africano, de países como Mali e Mauritânia. A PF, porém, não descarta que entre os mortos estejam pessoas de outras nacionalidades, especialmente da região do Caribe.
Os peritos vão analisar DNA e confrontar com o banco nacional de perfis genéticos, para saber se há identificação, se são brasileiros ou não. Segundo autoridades locais, a hipótese de que sejam estrangeiros é reforçada porque não houve ocorrência de brasileiros desaparecidos na região nos últimos dias.
Além de determinar os nomes das vítimas, o trabalho da perícia também tem o objetivo de determinar a causa das mortes e quando elas ocorreram.
Inicialmente, falava-se que o número de mortos era ainda maior. A polícia encontrou dentro do barco 25 capas de chuva, sendo 23 idênticas verdes e duas amarelas.
Em entrevista divulgada pela assessoria de imprensa da PF, o superintendente da corporação no Pará, José Roberto Peres, disse que foram encontrados documentos que indicaram que o barco saiu do continente africano em 17 de janeiro.
Peres acrescentou que, “provavelmente”, as mortes foram causadas por falta de alimento e de água.
O trabalho de identificação dos cadáveres irá se basear em critérios do protocolo de identificação de vítimas de desastres da Organização Internacional de Polícia Criminal, a Interpol. Esse protocolo é geralmente aplicado em situações de desastres naturais, ataques terroristas e acidentes aéreos, por exemplo. O trabalho é realizado em quatro etapas principais.
Segundo os princípios estabelecidos pela Interpol, durante o processo de identificação, as equipes deverão “tratar os restos mortais das vítimas com o máximo respeito e cuidado”. Segundo a organização, o processo de identificação deve ser transparente para informar o máximo possível os familiares.
Os protocolos de identificação de vítimas de desastres foram empregados, por exemplo, após o rompimento da Barragem de Brumadinho, em janeiro de 2019.
O procurador-chefe do Ministério Público Federal (MPF) no Pará, Felipe de Moura Palha, determinou a abertura de investigação na área criminal e de investigação na área cível, que será realizada pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, órgão do MPF para a defesa de direitos humanos.
De acordo com o órgão, a investigação criminal foca em eventuais crimes cometidos e na responsabilização penal de autores.
Por outro lado, a investigação cível concentra-se em questões de interesse público e na proteção de direitos que não necessariamente envolvem crimes.
A Marinha informou que uma equipe de inspetores navais da Capitania dos Portos da Amazônia Oriental foi acionada e está em deslocamento até o local do ocorrido, “a fim de apurar os elementos essenciais para abertura de investigação do Inquérito sobre Acidentes e Fatos da Navegação (IAFN)”.
A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) divulgou uma nota nesta terça-feira na qual lamenta as mortes e reforça ” a necessidade de haver uma abordagem de responsabilidades compartilhadas e integradas entre os diferentes países, com ações abrangentes e colaborativas em apoio às pessoas deslocadas à força em razão da violação de seus direitos, de perseguições, de desastres relacionados a mudanças climáticas e de violência generalizada em seus países de origem”.
A ACNUR “reafirma a necessidade de abordar os desafios do deslocamento forçado nos países de origem, trânsito e destino, propiciando o acesso seguro e irrestrito à proteção internacional e fortalecendo os sistemas de asilo nos países de destino”.
A agência diz ainda que “continua monitorando e apoiando os Estados para que, junto ao setor privado, comunidades deslocadas à força, organizações da sociedade civil e academia, possam responder de forma colaborativa a uma tendência preocupante de pessoas em necessidade de proteção empreendendo jornadas perigosas através de rotas inseguras”.
(Publicado por Fábio Munhoz. Com informações da Reuters e do Estadão Conteúdo)