THE NEW YORK TIMES – LIFE/STYLE — Agora que os ingressos para o Museu de Arte Moderna custam chocantes US$ 30 por pessoa (pouco mais de R$ 150), você provavelmente vai fazer questão de programar suas visitas com muito cuidado, tentando garantir que cada minuto valha a pena.
Mas digamos que você esteja no centro de Manhattan, com uma ou duas horas de sobra, e queira ver um pouco de cultura. Talvez você já tenha visto as exposições mais recentes do MoMA, ou talvez não queira desembolsar tanto dinheiro. Posso sugerir uma parada na matriz da Tiffany & Co. na Quinta Avenida?
Não, ali você não vai ver Demoiselles d’Avignon, nem Noite Estrelada, mas o que a Landmark (como a loja é conhecida) oferece é uma fusão inebriante de arte contemporânea e varejo de luxo que é tão notável e desconcertante quanto qualquer coisa que você poderia encontrar no museu.
Depois de uma reforma feita pelo arquiteto Peter Marino, inaugurada em abril do ano passado, 58 peças de grandes artistas que ele selecionou – muitas delas em azul, prata ou ambos – agora decoram o edifício de 84 anos. Embutido na parede perto dos elevadores, um oval de James Turrell que fica mudando de cor. Em outra parede, um armário de Damien Hirst, brilhante e coberto de fileiras de zircônia. Pairando ao lado dos anéis de noivado, um dos discos espelhados de Anish Kapoor. No térreo, catorze molduras de janelas em arco brilham com uma animação do artista Oyoram Visual Composer, mostrando o horizonte de Manhattan e do Central Park – uma cidade imaculada, sem gente, só pássaros.
E aquela Vênus de Arles, gigante e falsamente deteriorada, com uma pátina azul Tiffany? Ela veio da cabeça de Daniel Arsham, que dedicou sua carreira a colaborações corporativas mais banais. Ele desenhou uma pulseira e uma escultura em edição limitada para a marca, além de, abre aspas, “joias exclusivas, inspiradas no Pokémon”.
A obra mais importante aqui é a pintura Equals Pi, de Jean-Michel Basquiat, de 1982, seu ano mais marcante. (O MoMA, diga-se de passagem, não possui nenhuma pintura de Basquiat). Ela fica no alto de uma parede no térreo, coberta por um escudo translúcido – parece um pouco abandonada. Tem as coroas clássicas de Basquiat, além de algumas palavras manuscritas, e seu fundo turquesa é muito próximo da cor que é marca registrada da Tiffany. Quando Alexandre Arnault, executivo da Tiffany, usou o quadro numa campanha publicitária com Beyoncé e Jay-Z, em 2021, ele sugeriu que o artista talvez estivesse fazendo uma “homenagem” à marca. Pessoas que de fato conheciam Basquiat rejeitaram a hipótese prontamente.
Mas não vamos insistir no conflito. Quase tudo neste palácio de dez andares é brilhante, polido, antisséptico e está exatamente onde deveria estar. Arranjos de flores deslumbrantes, pilhas de livros de arte e amplos banheiros públicos. Os vendedores são infalivelmente gentis. “Estou só dando uma olhada”, falei a alguém que ofereceu ajuda. “Olhe à vontade”, ele respondeu. A atmosfera é levemente desorientadora, um pouco inquietante, como um cassino ou uma feira de arte para as elites. Tem muito dinheiro em jogo aqui.
Os fregueses bebem espumante ou água gelada enquanto experimentam joias. Um casal é levado para uma sala particular, onde os aguardam macarons em tons pastéis. Atrás de uma discreta corda de veludo azul dá para ver um corredor com pinturas de Hans Hartung e Jules de Balincourt (azul e mais azul).
É tentador esbravejar diante desta instrumentalização da arte erudita para vender acessórios de luxo, mas muitas décadas se passaram desde que Mark Rothko cancelou sua encomenda para o majestoso restaurante Four Seasons, supostamente dizendo: “Qualquer pessoa que coma esse tipo de comida por esse tipo de preço nunca vai olhar para uma pintura minha”. As ideias sobre a pureza da arte e o estigma da venda hoje são bem menos difundidas.
De todo jeito, o projeto de Marino para a Tiffany segue uma rica tradição. Na década de 1950, Jasper Johns e Robert Rauschenberg colaboraram em vitrines para a Bergdorf Goodman, bem perto da Tiffany’s, e a Bonwit Teller, um quarteirão ao sul. Eles usaram um pseudônimo, mas Rauschenberg mais tarde teve uma obra em exibição na Bonwit Teller. (A dupla também trabalhou com Gene Moore na Tiffany; obras do designer aparecem em exposições na Landmark).
Em 1970, a revista Print Collector’s Newsletter brincou que “‘galeria de loja de departamentos’ é uma definição enganosa; não é exatamente um insulto, mas com certeza não se trata de um elogio”. Seria uma “arte mediana”. De fato, grande parte da arte na Tiffany é mediana – o tipo de coisa apropriada e profissional que se pode encontrar nas vendas diárias das casas de leilões ou em estandes pouco inspirados em feiras de arte em qualquer lugar do mundo. Uma marca tão rica poderia ter sido muito mais ousada e ambiciosa.
De qualquer forma, durante os próximos dois meses, você poderá ver mais de perto o gosto de Marino reservando um ingresso grátis para a mostra ‘Cultura da Criatividade: Uma Exposição da Peter Marino Art Foundation’, que está em exibição na Tiffany Gallery – um espaço mais arejado no alto do edifício, projetado por Shohei Shigematsu, do OMA, com vistas excelentes para os arranha-céus ultraluxuosos em torno do Central Park. Você vai encontrar quase 70 peças adicionais, entre elas a intrincada e espirituosa prataria Tiffany do século 19; ovelhas de bronze (de François-Xavier Lalanne) em cima de grama artificial; peças de artistas representados em outras partes da loja (Francesco Clemente, Vik Muniz, Sarah Sze); e muitos retratos de Marino: estampados no espelho de Michelangelo Pistoletto, em fotos de Roe Ethridge e pintado sobre cacos de pratos na obra de Julian Schnabel.
Há um momento muito sombrio que me surpreendeu na mostra sobre Marino: uma imensa fotografia de Sarah Charlesworth (1980) mostrando um homem caindo de um prédio. Curiosamente, ecoa duas grandes peças que Rashid Johnson criou para a loja, como parte da série ‘Homem em queda’. As representações de homens pixelados e de cabeça para baixo (azul Tiffany) de Johnson lembram personagens de videogame de 8 bits. Em volta deles, painéis de espelhos arranhados e rachados, como se tivessem sofrido marteladas.
Essas obras querem ser “investigações existenciais, ou seja, a ideia do homem caindo no espaço, encontrando a si mesmo”, disse Johnson a um entrevistador no ano passado. Pode ser. Mas você também pode vê-los como retratos de uma cultura decidida à autodestruição (ou contornos de corpos na cena do crime). Se você passar um tempo com eles, vai descobrir que a violência das obras fica com você.
Você vai precisar relaxar depois dessa experiência vertiginosa. Os US$ 30 que você economizou não vão muito longe no Blue Box Café, desenhado por Daniel Boulud, no sexto andar, onde o menu “Breakfast at Tiffany’s” custa US$ 59 por pessoa (sem contar impostos e gorjeta), mas pelo menos você pode desfrutar de uma taça de champanhe enquanto reflete. Por que não pedir uma segunda? Uma terceira? Este momento não vai durar para sempre. / TRADUÇÃO DE RENATO PRELORENTZOU
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